sexta-feira, 15 de maio de 2009

Olívia

Olívia

Acordo. Não me apetece levantar. Sinto-me meio pesada hoje. Sinto que o esforço de ser feliz às vezes pode ser cansativo. Custa fazer o trabalho todo sozinha. Custa e deixa-me e questionar se consigo. Levanto-me e lavo a cara no quarto-de-banho, ao som de Nina Simone. Penso na minha própria sugestão, faz alguns dias. Perguntei, de mim para mim, qual seria o problema de visitar um psicólogo. Sei lá, para ver como é, para ver se me ajuda a tentar fazer algum sentido destas ideias que tenho, dos pensamentos que me ocorrem todos os dias, todos os segundos. Penso. Não só dos maus, concerteza, mas de toda esta confusão de esforços que tenho. Sinto a minha mente a puxar por tudo quanto é lado. Entro no chuveiro, arrepio-me com a água fria e queimo-me com a rápida mudança para água quente. Sinto que o que tenho e o que quero nunca será o mesmo, e se por um lado tento aceitar isso sem problema, por outro vejo tal tarefa como algo talvez demasiado exigente. Sempre me senti assim, difícil de agradar. O que é mais interessante é que, quanto mais tempo passa, não sei se, nem que só por vezes, o que me davam, ou o que eu me dava, era suficiente. Não tenho um caderno onde possa anotar o que me dão, e o que é suficiente, e isso faz com que, pelo sim, pelo não, queira tudo. Entro no quarto e começo a vestir-me, sem pensar em demasia naquilo que levar. Sim, talvez uma opinião de alguém de fora, treinado em ver as coisas com mais clareza, me pudesse ajudar. Se bem que ninguém tem a fórmula secreta…
Pinto os lábios na fila do trânsito lisboeta. Reparo como me esqueci de ligar o rádio, ritual de todos os dias. Inclinada que estou para pensar e questionar, penso se estarei a pensar em demasia, e isso me deixe assim, alheada do que costumo fazer, de como costumo ser. Como é possível pensar-se que talvez se esteja a pensar em demasia? É mesmo disto que falo! Às vezes parece que a minha VIDA e a minha maneira de ser têm de ter sido criadas por alguém. Tenho pensado (claro) nisto, e pensar em Deus é para mim muito aborrecido. Queria a minha existência mais fictícia, como que preferindo ter a minha própria forma de ser, ainda que irreal, do que a realidade de toda a gente.
Chego à escola e estaciono o FIAT à minha própria maneira, e quando saio acendo um cigarro. Vejo umas dezenas de carros novos. Sempre gostei de Setembro e as novas enchentes de professores que vêm contaminar o espírito de velhice das paredes colegiais. Estou prestes a acabar o cigarro e entrar, quando vejo, ao fundo, saindo de um Renault qualquer coisa alguém que me parece um sério candidato a professor mais bonito do ano. É alto, tem cara de poucos amigos, um rosto redondo e veste-se impecavelmente.

- Eduardo, prazer! – anuncia, quando finalmente nos apresentamos, na sala dos professores. A sua voz não é tão firme como imaginava, e vi a sua cara de poucos amigos subitamente transmitir-me alguém muito simpático e interessante. Facto é que, apesar de ser diferente do que aquilo que imaginei, passado uma hora de conversa estou caída por ele. Gostei sobretudo da maneira como a conversa saltava de tema em tema, com um fio condutor invisível mas que me deixava com a confortável sensação de ser ouvida e entendida.

Quando vim para casa, trazia comigo um sentimento diferente. Afastei um pouco para o canto a ideia de visitar um psicólogo, apenas porque alguém fora capaz de me ouvir por horas a fio. Que quero, então? Que me percebam? Penso nos meus pensamentos de manhã, e em como tudo o que eu queria era perceber-me, e questiono a ligação que há, ou não, entre alguém me perceber, e eu própria o fazer. Talvez seja uma perversa mistura entre ter um potencial amante, e alguém com quem conversar ao mesmo tempo, algo de que (quase) sempre fui privada, nesta contagiante VIDA…

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