sábado, 15 de dezembro de 2007

Um Título Qualquer - Onze

Where Eagles Have Been - Wolfmother

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A noite é a mesma, sem tirar nem por. O ambiente, todavia, é diferente. Casado, e com um filho. Antes do casamento, muitos anos de namoro. E nunca nada assim se tinha passado. Penso na imagem que tinha de mim e comparo-a com a que tenho. Como será possível as certezas que temos serem tão frágeis. Haverá realmente certezas?... foda-se…

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Tenho mais de meia hora de caminho pela frente, mas vou a pé. Visto o casaco, enterro o chapéu na cabeça, acendo um cigarro. Caminho lentamente, para poder fruir mais cada passa que dou do meu companheiro. Imagino Godelieve na cama, a dormir, ou a vestir-se, ou a fazer o que quer que seja, imagino-a apenas. No futuro reside uma incerteza. Quero deixar-lhe uma mensagem no Vrijheid, mas a outra parte de mim diz-me que foi bom, e o melhor será parar enquanto nada mais se passa. Tento pensar na minha mulher, para tentar amenizar um pouco o que sinto, para desviar as minhas atenções de onde têm de ser desviadas, mas o pior é que é-me impossível. Sei que amo a minha mulher, e por isso mesmo sinto-me um cabrão em querer pensar nela, e em tudo o que me salta à cabeça ser a imagem indelével de Godelieve… sentada no meu colo, deitada em cima de mim, a fumar, a beber… seja de que maneira for, a imagem é demasiado perfeita e pesada demais para conseguir suportar. Como se a única maneira que tivesse de me libertar fosse esgotar duma vez apenas todos os pensamentos estúpidos que tenho. Pena que seja como um vírus… quando mais penso…

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Chego a casa.

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- Então!? Fartei-me de te ligar! Não apareces para jantar, não dizes nada, não atendes o telefone! – Vejo-a gritar para mim, numa senda interminável. Que selecção de imagem… Não a ouço, não digo nada. Selecciono, sem o querer, todos os maus estímulos, e mais uma vez sem o querer, estabeleço a estúpida comparação do que tive há menos de uma hora, e do que me espera agora, alguém de pijama, cabelo apanhado sem estilo algum, a gritar-me, a trazer ao de cima todas as responsabilidades e deveres que tenho e por momentos esqueci. Claro que ela estava assim porque ia dormir, e claro que estava a gritar comigo com razão, mas a minha própria racionalidade continuava posta de lado, e numa atitude estúpida e arrogante, nem me desculpo, simplesmente digo que “Não planeei bem o tempo…” e vou para a varanda fumar um cigarro. Este não sou eu. O “eu” normal, que eu conheço e sempre existiu, arrisco dizer, o “eu pré-Godelieve”, ainda que cometendo o erro que cometeu, desceria a si e pediria mil perdões pelo atraso, inventando uma qualquer desculpa plausível. Incrível como sei o que posso e devo fazer, e mais incrível ainda, a maneira como não o quero fazer.

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Ela vai dormir. Eu tomo um whiskey, e adormeço na sala.

6 comentários:

Silvia Madureira disse...

Uma história dos nossos dias infelizmente! Que pena alguns homens não serem capazes de acharem sensualidade numa mulher vestida de pijama, que pena os homens apenas se excitarem com uma boneca de trapos daquelas que apenas servem para fazer sexo...

Mais pena tenho...quando os homens não são capazes de assumir o que fazem vendo que fazem sofrer os outros...mas normalmente a mentira tem perna curta muito curta...

Penso que este jogo não leva a lado nenhum...pode durar até um ano...mas a mulher de pijama vai-se cansar daquele homem que no fundo a desilude quando se perdeu no tempo.

beijo

Hands of Time disse...

Realmente... e porquê, só a mulher? Será que os homens também não vestem pijamas...? E elas não se cansam?
Boa semana!

Anónimo disse...

Certezas, certezas? Acho que só duas.
Talvez ao despertar seja altura para mudar.

Aproveito para desejar ao "Jovem" um Super 2008!!!

Tudo de bom

Grande abraço do "rapaz"

Diego. disse...

*wolfmother é muito bom*

há de se viver com veracidade, tanto faz o sexo...

abraço!

Anónimo disse...

Um estória muito boa, como já nos tens habituado, que fica bem melhor com a banda sonora com que nos brindaste...fico agradecido por me dares a conhecer mais uma banda para juntar ao rol de todas as outras! Tem um excelente ano, e claro um feliz natal!

liliana pacheco disse...

Parabéns pela distinção Pedro!

É bem merecida ;)... Já agora aproveito para te desejar um Feliz Natal e um ano novo cheio de alegrias.

Beijinho*