Foda-se! Nem uma sesta de meia hora se pode tirar! Este Agosto está dos piores que me recordo… Levanto-me mal me chamam, o reboliço do costume. Os colegas que tomavam café saem a correr também para preparar tudo. Em menos de 10 minutos estamos no carro.
- Foda-se pá, será que é do mesmo cabrão? – pergunta-me o Pereira.
- De certeza! 5 incêndios em 3 semanas, achas que é coincidência?... – respondo. Vamos sentados no banco da frente, entre solavancos vamos falando da VIDA que temos tido nos últimos tempos… sempre daqui para ali, sempre com trabalho, e sempre aquela sensação inglória. Acaba um, mas é só um. De certeza que é tudo merda dum gajo que tem um prazer mórbido qualquer
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- Olha pá – diz-me o Pereira – Sempre vens Sábado? – Está a falar-me do baptizado do seu segundo filho.
- Claro que sim! Agora vê lá se desta vez esperas mais que um ano para ter outro! É que isto de dar prendas de baptizado uma vez por ano não fica barato! – brinco. O Pereira tinha tido o segundo rebento, e o primeiro tinha ainda um ano.
Quando chegamos, o cenário não é agradável. Os acessos são difíceis, e temos de agir rapidamente para que não alastre para as casas, que se encontram a
- Foda-se pá, ia sendo desta!
- O Pereira?? – pergunta-me o chefe. Estava de costas. Acho que a minha ânsia de encontrar o Pereira era tanta que me iludi completamente. Procuro o Pereira entre o resto do grupo. A cara de toda a gente é de interrogação, a minha suponho ser de desespero.
Conseguimos extinguir o fogo no dia seguinte. Encontramos o Pereira passado umas horas, prostrado no chão, carbonizado. Estou em pé, ao lado do seu corpo, uma lágrima escorre-me de cada olho. Penso no porquê disto tudo. No porquê de alguém ter de morrer tentando fazer o bem, salvar o próximo. E penso especialmente no porquê de alguém gerar, propositadamente este tipo de situações. Famílias que perdem as casas, tudo o que têm, pessoas que perdem as suas VIDAS… a troco de quê? A troco de quê? Penso, penso, e não consigo encontrar uma explicação racional para esta maldade genuína que habita algumas pessoas.
O funeral, apesar de digno, assemelha-se ao extinguir dum incêndio destes. O Pereira, com uma mulher e dois filhos pequenos, perdeu a VIDA, e na semana seguinte, tudo estaria igual. Os rituais não mudam, a maldade de tanta gente não muda, o que será que realmente muda neste mundo?...
2 comentários:
Responsta à pergunta: nada; nunca muda nada. Chamar a atenção para o flagelo, para o crime dos fogos florestais através de uma história destas, é serviço público. PARABÉNS!
Fiquei perdida entre o "não vou morrer assim" e o "(...)não muda, o que será que muda neste mundo?..."
Muda! Muda sim! Nem sempre muda é para melhor outras vezes demora muito a mudar... mas há-de mudar para que não se morra assim!
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