segunda-feira, 17 de março de 2008

Carta

Blue Light - Blooc Party

Vale de Cambra, 29 Dezembro 2008

Z.,

Quatro e cinquenta e cinco da tarde. Tempo chuvoso. Toca a música que me lembra de ti. Sei que não devia ouvir, sei-o bem, tão bem… Mas gosto de me massacrar, gosto de sentir este desespero que me deixa a desejar um passado diferente. Não. Um passado igual, apenas com a decisão fundamental diferente. Serás tu, realmente, a “Bluest Light”? Como espero que não… A melodia toca no computador, mas sinto a batida dentro de mim. O peso da solidão que deixaste em mim é avassalador, e o sentimento de culpa que tenho cospe-me na cara. Vejo pessoas ao me redor, quero ser cada uma, se por um momento pudesse deixar de ser quem sou. Quero ser tudo o que não sou, porque, no fundo, me odeio. Expulsei-te da minha VIDA, num misto de pseudo-heroísmo e estupidez. Querias estar comigo, tratando-te eu como te tratava. Estava disposto a mudar? Não. Arrependo-me? Como…

Acho que, naquele momento em que consegui sair de mim próprio e olhar para a nossa relação, percebi o mal que te fazia. É incrível a disparidade de sentimentos que tenho em relação ao nosso fim. Por um lado acho que a melhor coisa que fiz foi libertar-te de mim, por outro, essa decisão fez com que me sinta aos pedaços VIDA fora… Sempre me senti despedaçado, sabe-lo bem, mas acho que talvez fosses tu que me aguentasses todos esses pedaços, bem juntos, dentro de ti, e me fizesses esquecer de tudo o que tinha que esquecer, apenas com o olhar.

Saudade,

M.


Braga, 1 de Janeiro 2009

M.,

Quando vi a tua carta, na minha caixa de correio, o meu coração disparou. Não sabia muito bem o que sentir, não sabia se queria ler. Pensando na última vez que te vi, queria rasgar a carta. Nunca aconteceria. Com um sorriso, pensando que apenas tu enviarias uma carta nos tempos de hoje, peguei, abri, e li. Fui estúpida. A dor de ver o teu nome, a saudade de tudo o que tivemos deixa-me confusa, desamparada. Ainda assim, não li mais nada até perceber que ouvias a nossa música. Corri para casa. O A. perguntou-me o que tinha na mão, quis mentir, mas disse que era uma carta tua. Chamou-te nomes, mas não quis saber, entrei no quarto, pus eu própria a mesma música, e sentei-me a ler. Chamo-me estúpida porque ouvir a nossa música ao ler as tuas palavras fizeram-me sentir incrivelmente triste. Nem percebo a minha reacção… tu és, ou foste, um cabrão comigo vezes sem conta. Uma parte de mim odeia-te por isso. Mas quero que saibas que a parte de mim que ainda te ama suplanta a parte que te odeia. Ainda que ninguém o perceba.

Saudade,

Z.


Vale de Cambra, 5 Janeiro 2009

Z.,

“If that’s the way it is, then that’s the way it is…”

Quantas vezes repeti estas frases na minha cabeça… pensava em ti, no que perdi, e tentava convencer-me que simplesmente tinha de ser assim. Tenho pena, claro, de te ter perdido, mas… Por favor percebe o meu funcionamento, por favor percebe a maneira estúpida que tenho de afastar as pessoas que amo, por favor percebe isso, e percebe o quanto estou disposto a mudar. Nada do que vejo faz sentido. Apenas tu davas cor às coisas, guiavas-me, deixavas-me sair da minha alma, limpá-la um pouco. Não consegues imaginar o que sinto ao ter de viver sem o teu sorriso terapêutico, amarrado à tua fotografia, que levo para onde quer que vá, ouvindo a nossa música vezes em conta, até me sentir tonto…

Tenho pena de a primeira vez que te digo isto seja num papel, estando tu a 300km de mim, mas peço-te perdão, ainda que sendo tarde de mais, por tudo o que fiz, e suplico-te…

Voltas?

Saudade,

M.


Braga, 31 Janeiro 2009

M.,

Após ter-te enviado a minha carta, esperava sentir-me liberta, não sei porquê, nem de quê, mas o sentimento não veio. Dei por mim a ver a minha caixa de correio todos os dias, sentindo-me, ao não ver nada, ora triste, ora alegre. Talvez fossem as minhas diferentes partes (a que te odeia e a que te ama), a darem voz ao seu interior… Quando vi uma nova carta tua, o processo foi idêntico. Desta feita o A. Não me viu, não teve oportunidade de te chamar nomes e de me fazer odiá-lo naquele momento.

Tenho de ser sincera contigo, como sempre fui. Quando acabei de ler a carta senti-me profundamente triste e, acima de tudo, zangada. Como é que podes fazer isto? Como é que, depois de tudo o que se passou, depois de tudo o que foi dito, depois deste tempo todo, me vens pedir para voltar? Não imaginas como me sinto em desespero! Há agonia a transbordar em mim, pela tua eterna falta de sentido do tempo, falta de preocupação comigo,… agora casada, com uma VIDA estável, a planear ter um filho (sofre), que direito tens tu de agitar assim toda a minha existência? Querido…

Tenho pena da falta de cor na tua VIDA neste momento. Parte de mim… não, toda eu gostaria que as coisas tivessem acontecido doutra forma, gostaria que quando te disse que se saísse pela tua porta, nunca mais me verias, me tivesses pedido, mais uma vez, perdão, e te tivesses comprometido a mudar… mas tu não o fizeste, e sofri, como sofri. Mas, e isto custa-me dizer, vais ter de viver com o peso das tuas decisões, e seguir… como quero que sejas feliz…

A minha VIDA, com o A., sou honesta, não tem aqueles tons brilhantes e coloridos que tinha quando estava contigo. Mas também são muito raros os momentos em que vejo o mundo apenas com duas cores. A paixão dói, o amor conforta. Optei.

“If that’s the way it is, then that’s the way it is…”

Adeus,

Z.

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