quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Westland Story Nineteen

The Dining Rooms – Ink

The Dining Rooms – Thank You?

[- Vamos continuar a nos encontrar assim? – pergunto, sentido os seus lábios percorrer o meu pescoço, que se arrepia ligeiramente…]

Nesse dia não vim a casa depois do trabalho. Liguei a Y, e fomos jantar ao X. Envio uma mensagem para casa, a avisar o que tinha decidido. “Quando te lembrares que tens uma família, estamos por cá, no mesmo sítio…”, recebo, como resposta, deixando-me satisfeito por assim o ter decidido. Nestes momentos, em que obtinha reacções assim, sentia quase no máximo a repulsa pela rotina e VIDA que toda a gente acha normal. Ainda que essa resposta, quem sabe, fosse apropriada face a minha constante ausência…

- Vais-te encontrar com ela hoje? – pergunta.

- Como é que sabes? – pergunto, francamente surpreendido, na medida em que nada lhe tinha dito, ou sugerido.

- Meu caro, estás com essa cara filho-da-puta…

- Como assim? – questiono, antes de dar um gole do copo, cheio até três quartos de vinho tinto.

- Não sei bem dizer o que me sugere isso, mas acho que é um brilho qualquer que ganhas nos olhos. Meio maquiavélico, quase irreconhecível.

- Irreconhecível?

- Bem, a tua cara, está claro, é a mesma. Mas há algo em ti que muda, e pelo menos eu, que acho que te conheço bem, percebo logo.

- Achas que me conheces bem? – pergunto, pousando o copo na toalha branca e cinzenta, fruto de algumas sacudidelas do cigarro mal conseguidas. Sento-me um pouco mais à frente na cadeira, encarando-o, enquanto a espero a sua resposta, na qual estou francamente interessado.

- Não conheço? – responde, perguntando. Sinto que se sentiu invadido pela minha postura, suscitando nele uma dúvida que, imagino, desconhecia.

- Não sei, conheces?

- Deixa-te de jogos, ok? – atira, lançando o olhar para o ar, e pegando num cigarro – Se calhar tens razão, não conheço… Este tipo de merdas, o teu olhar, a tua postura, nem sempre é a mesma… - relaxo a postura, encostando-me um pouco para trás. Volto a encher o copo.

- Não sei que te diga. Posso dizer-te que, se há alguém que me conhece, és tu… – vai a interromper, soltando um par de letras que me deixa adivinhar o que vai dizer – Ela não me conhece, nem penses… acho que ela é quase quem menos me conhece. Conhece a ideia que tem do homem com quem se casou, e agarra-se a essa ideia idealizada (…) duma maneira que… me incomoda…

- Porquê?

[- Eu não tenho nada contra… – responde, abraçando-me e desta feita sendo ela puxando-me para si, como se nenhum pedaço da nossa pele se pudesse dar ao luxo de não sentir o outro. Encosta a face no meu peito, e sinto a sua respiração quente. – Desde que nos continuemos a encontrar, pode ser da maneira que tu quiseres…]

- Porque eu sinto-me diferente. Tens razão. Foi desde que a conheci, é verdade, mas acho que agora sou mais eu. – sinto que se interessa na conversa. Desta vez é ele quem se aproxima. Apoia o cotovelo na mesa direita e a face no punho do mesmo braço.

- Então e antes eras quem?

- Se queres que te diga, era alguém como tu. Pensa. Qual é a diferença entre o eu que tu achavas conhecer e o tu? O nome, o sítio onde se vive, a família? A nossa maneira de viver era igual. Trabalho, casa, responsabilidades às quais nunca conseguimos fugir, fachadas, jantares de competição pela família mais feliz, quando no fundo estamos aborrecidos de morte no dia-a-dia…

- E o que pensamos? Ou vais dizer-me que o que pensamos e sentimos era igual?

- Não era exactamente igual… mas o que pensamos, e quando pensamos (porque se pensares nisso passamos dias inteiros sem questionar que caralho andamos aqui a fazer), nunca nos atrevemos a concretizar… todos nós, por isso o que pensamos não interessa tanto, porque nunca chega a acontecer… e o facto de não chegar a acontecer faz-nos sentir a todos também da mesma maneira… uma frustração incrível, que tentamos disfarçar a comprar casas melhores, carros melhores, e sorrir como se o mundo fosse acabar amanhã… – sinto-o confuso. Vejo que não concorda, ou não quer concordar, com o que digo, mas vejo também a dificuldade em arranjar argumentos para me contrariar.

[Volto-me e encaro-a. O seu cabelo está molhado, e sinto algumas gotas deslizarem e juntarem-se à humidade das nossas bocas. As minhas mãos abraçam a sua cinta, puxo-a para mim.]

- Estás a dizer que te sentes frustrado? Ou infeliz?

- Pelo contrário! Sinto-me perfeitamente. Ora me sinto uma merda, ora me sinto perfeitamente… mas sinto-me, e o facto de sentir, ainda que por vezes me sinta uma merda, faz-me sentir feliz!

- Deixa-me ver se percebo… tu estás a dizer que às vezes te sentes feliz por te sentires uma merda? – damos uma sonora gargalhada em conjunto.

- Não é bem isso… eu sinto-me feliz por sentir. Independentemente de sentir seja o que for! Desde que sinta!

- Dantes não sentias…

- Não. Pensava que sentia, mas limitava-me a fazer o que era suposto fazer… percebes, nem que seja um por cento, do que te quero dizer?... – pergunto, enquanto acendo um cigarro. Ele cala-se uns segundos. O seu olhar sai de mim e cola-se a um movimento qualquer, lá atrás, num infinito qualquer.

- Percebo bem mais do que tu pensas… – solta, em tom de desabafo…

3 comentários:

Sei que existes disse...

É complicado quando se chega á conclusão que não se está a viver...
Continuação de uma estória interessante!
Beijo grande

Sei que existes disse...

Tens um prémio lá no meu cantinho.
Beijo grande

Catarina M disse...

"cara de filho da puta"... =)
Beijoca